Elizete Carvalho faz uma simples explicação sobre a socioafetividade: Os laços afetivos e de amor são fundamentais à mediação familiar.
O amor familiar é fecundo, e não somente porque gera novas vidas, mas porque amplia o horizonte da existência, gera um mundo novo; faz-nos acreditar, contra toda a desesperança e derrotismo, que uma convivência baseada no respeito e na confiança é possível.
(Papa Francisco -19-08-2014)
De acordo com Rodrigo Pereira da Cunha, 2018, p. 714, a expressão socioafetividade foi cunhada pelo Direito brasileiro sendo utilizada pela primeira vez, em 1992 pelo jurista paranaense, Luiz Edson Fachin, em seu livro Estabelecimento da Filiação e Paternidade Presumida (Ed. Del Rey). Esclarece o autor ainda que já em 1979 as bases da compreensão do tema foi objeto do texto do jurista mineiro João Batista Villela: Desbiologização da Paternidade (Revista da Faculdade de Direito da UFMG, v.21, p.401-419), explicando que a significa a relação exercida entre duas ou mais pessoas caracterizadas pelo forte vínculo afetivo e pelo exercício das funções e lugares definidos de pai, filho ou irmãos.
Assim, a socioafetividade pode ser base geradora do parentesco, seja em razão do exercício da paternidade, maternidade, irmandade, ou outro vínculo parental, que se consolida ao longo do tempo. Advém daí se falar de parentalidade socioafetiva, que pode se apresentar por meio da adoção, inseminação artificial heteróloga ou posse do estado de filho (PEREIRA, 2018, p. 715).
A família socioafetiva é a constituída por laços de afeto, com ou sem vínculo biológico. Todo tipo de família, segundo Pereira, 2018. P. 358, deveria se formar tendo como alicerce a afetividade e o amor, faltantes esses elementos, não se constituiria uma verdadeira família. São essas hoje as bases fundantes da família e seus sujeitos, amplamente aceito pela doutrina, jurisprudência, meios jurídicos e sociais. Também reconhecida pelo Código Civil de 2002, art. 1.593, outras formas de parentesco além do tradicional: “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”
O STF em análise do RE 898.060, com repercussão geral reconhecida firmou a seguinte tese: a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação, concomitantemente baseado na origem biológica, com efeitos jurídicos próprios.
Por fim, dentre os diversos julgados sobre o tema, destaca-se do TJMG a apelação cível interposta por D. A. M. em face da r. sentença de f. 208/211, proferida pelo MM. Juiz de Direito Pedro Aleixo Neto, da 6ª Vara de Família desta comarca da Capital, que, nos autos de ação negatória de paternidade proposta contra D. A. M. J., julgou improcedente o pedido inicial, reconhecendo, e fazendo prevalecer, a paternidade socioafetiva existente entre as partes:
Número do 1.0024.08.137534-7/001 Numeração 1375347- Relator: Des.(a) Áurea Brasil Relator do Acordão: Des.(a) Áurea Brasil Data do Julgamento: 30/01/2014 Data da Publicação: 07/02/2014.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - NEGATÓRIA DE PATERNIDADE E EXONERATÓRIA DE PENSÃO ALIMENTÍCIA - VÍNCULO SOCIOAFETIVO - EXISTÊNCIA - PAI QUE, MESMO EM DÚVIDA ACERCA DO LIAME BIOLÓGICO, SE DEDICA À FORMAÇÃO DO FILHO ATÉ A FASE ADULTA - RECONHECIMENTO, PELO FILHO ADULTO, DA REFERÊNCIA PATERNA -RECURSO NÃO PROVIDO
1. A paternidade há de ser reconhecida não como um fato da natureza, cuja origem se radica em pura base biológica, mas um fato cultural, que se assenta na circunstância de amar e servir, fundada no exercício da liberdade e autodeterminação. 2. Não pode ser considerado pai aquele que apenas participa, como procriador, de um evento da natureza, ou seja, do nascimento de um novo ser, sem construir qualquer relação de afeto e assumir os cuidados na sua formação. Por outro lado, àquele que, mesmo sabendo da inexistência de vínculo de consanguinidade (ou, como no caso dos autos, tendo dúvidas acerca deste liame), assume com todo o carinho, amor e dedicação, a criação de uma pessoa até o atingimento de sua fase adulta, outra denominação e reconhecimento não se pode dar, que não a do pai verdadeiro. 3. Existência de mútuo afeto, em relação construída ao longo de toda a infância e adolescência do filho, estabelecendo verdadeiro vínculo de paternidade socioafetiva, que manteve as partes unidas mesmo após o afastamento do pai do lar conjugal - e a despeito das dúvidas que cercavam a origem biológica do requerido. 4. Relação de socioafetividade presente, não podendo ser desconsiderada com fundamento na inexistência de vínculo biológico, ou em uma suposta aproximação do filho com seu procriador, o que teria gerado ciúme e sentimento de traição no pai. 5. Recurso não provido.
Referência:
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Dicionário de direito de família e sucessões. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
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